terça-feira, 25 de maio de 2010

Meu amigo Paulo Coelho

por Alexandre Lalas

Fazia frio naquela bela manhã de outono em Montalcino, histórica cidadezinha no interior da Toscana. O ano era 2005. Acordei bem cedo e fui andar pelas ruelas. Era domingo e o comércio ainda estava fechado. O lugar estava deserto e parecia que a cidade era toda minha. Passei pela igreja, pela praça e cheguei à Fortezza de Montalcino, um castelo medieval que se manteve de pé ao longo de guerras e invasões. Quando entrei, a loja de vinhos que fica dentro da fortaleza estava fechada, mas ao acabar a minha visita, a enoteca recém-abrira e ainda não tinha nenhum outro cliente. Dei uma olhada pelos vinhos, uma autêntica parede de brunellos. Vi também que a loja oferecia duas degustações verticais: uma de Brunello Biondi-Santi, de cinco diferentes safras, custava 25 euros. Mas a que me chamou mais a atenção foi a outra: seis safras do Sassicaia, um dos maiores vinhos italianos, por 75 euros. Abri a carteira, contei meus trocados e vi, resignado, que teria que me contentar com a prova de Biondi-Santi.

A atendente era uma italiana baixinha e bem gordinha, com os cabelos presos, de cerca de 40 e poucos anos. Paguei a ela e comecei, com meu italiano macarrônico, um papo informal enquanto ela me servia os vinhos, que, por sinal, estavam maravilhosos. Papo vai e papo vem, ela, percebendo meu sotaque pra lá de estranho, me perguntou de onde eu era.

- Brasil, respondi.

A senhora sorriu e disse que tinha muita vontade de conhecer o Brasil, que adorava a nossa cultura e coisa e tal. Perguntei a ela o que conhecia do nosso país, e ela, de primeira, rebateu:

- Sou muito fã de Paulo Coelho! Li todos os seus livros!

Acometido por um súbito ataque de canalhice, menti descaradamente, sem titubear:

- Paulo Coelho?!?! É muito meu amigo!! Meu vizinho de porta, no Rio de Janeiro!

A mulher se transformou. Parecia que ela estava diante de uma celebridade. Queria saber tudo sobre o escritor. Se era simpático, se tinha cachorro, se saía muito de casa, seu prato preferido, e tudo mais que a sua imaginação permitisse perguntar. Eu, que nunca encontrei Paulo Coelho na minha vida, ia inventando as respostas.

Finda a prova dos brunellos, eu já me preparava para encerrar o papo e ir embora quando a senhora me ofereceu, por conta da casa, a degustação de Sassicaia. Aí foi a vez de os meus olhos brilharem. Eu nunca tinha provado o vinho. No Brasil, seu preço estava muitos zeros acima do meu apertado orçamento. Evidentemente, não havia como recusar. Eram seis safras: 1985, 1990, 1995, 1996, 1997 e 1998. Difícil descrever em palavras a emoção que sentia a cada gole. E a senhora, inebriada por imaginar estar na presença de um sujeito íntimo de um de seus grandes ídolos, caprichava na dose. Meu preferido foi o Sassicaia 1985. Mas poderia ter sido o 1990, ou o 1995. Estavam todos magníficos. Saí de lá com a alma nas nuvens. E com a obrigação moral de, no dia em que esbarrar com Paulo Coelho em algum lugar, dar-lhe meu muitíssimo obrigado. Mesmo que ele jamais entenda a razão.

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