sexta-feira, 16 de março de 2012

Os grandes produtores de vinho brasileiro estão com fome. O apetite parece cada vez mais incontrolável. Depois do abominável selo fiscal dos trópicos, eis que os "gênios" que dominam a produção do vinho nacional conseguiram a proeza de retirar não um coelho, mas um mamute da cartola: a lei da salvaguarda. Em bom português, trata-se de um projeto indecente, que visa, como forma de proteger o vinho nacional das invasões bárbaras dos produtos do resto do mundo, aumentar o imposto de importação de 27% para 55%! Ou seja, já temos um dos maiores impostos do mundo! Mas a carga tributária insana vigente no Brasil não parece ser suficiente para proteger os pobres coitadinhos dos grandes produtores nacionais. Eles querem mais. Não importa os meios que tenham que usar para conquistar mais mercado. Por trás deste movimento estão quatro entidades, todas sediadas no Rio Grande do Sul, estado que concentra a produção nacional, tanto de vinhos finos como os de mesa: o Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), a União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), a Federação das Cooperativas do Vinho (Fecovinho) e o Sindicato da Indústria do Vinho do Estado do Rio Grande do Sul (Sindivinho) e as vinícolas Aurora, Salton, Miolo, Perini, Luiz Argenta e Don Giovanni.

E quando falo os grandes produtores nacionais, é porque os pequenos, artesanais, estes sim, pobres coitados, sofrem com a "burrocracia" do selo fiscal e sofrerão novamente com o aumento desta alíquota. A razão é simples: a competição é o melhor regulador do mercado. Quem trabalha bem fica. Quem não faz direito, morre. Os grandes produtores, latifundiários do vinho, alegam que competem em condições desiguais, pois não têm os mesmos incentivos à produção que outros países desfrutam. Ora bolas, se o problema é esse, que lutem, pois, com a mesma sede, por uma redução nos custos da cadeia produtiva.

Há 15 anos, o vinho brasileiro de qualidade não existia. Os produtores, na grande maioria descendentes de italianos, faziam um produto pra lá de ruim, cheio de defeitos, fruto de ideias defasadas na vinha e de ausência de conhecimento na adega. Se este quadro mudou, foi por conta da chegada dos vinhos importados, que abriram o mercado e os olhos destes produtores para a porcaria que eles faziam.

Pois o mercado cresceu, a cultura de vinho vai aos poucos sendo instalada no país. E se os vinhos brasileiros não cresceram na mesma proporção é porque não trabalharam direito. Inexiste uma política de preços, de custos, o marketing é feito ao deus-dará. Não há união entre os grandes produtores, exceto quando o assunto é taxar o vinho importado.

O inimigo do vinho brasileiro não é o produto importado. Mas a falta de visão dos grandes produtores. E a qualidade (ainda discutível) e o preço fora da realidade dos vinhos que produzem.

É hora de dar um BASTA! Consumidor, reaja! Caso esta lei seja aprovada, NÃO COMPRE MAIS vinho brasileiro, especialmente os feitos por estes produtores que nos querem empurrar goela abaixo as próprias limitações. O BOICOTE é nossa arma!

Se você também é contra, assine o abaixo-assinado contra esse abuso no link:

http://www.peticaopublica.com.br/?pi=P2012N22143


Alexandre Lalas
jornalista e crítico de vinhos

quarta-feira, 14 de março de 2012

Volta ao mundo em cinco pratos

Inês Braconnot, crudívora de carteirinha (a esq na foto, com a chef), me convidou na semana passada para um jantar diferente, pelo menos para mim. No menu só ingredientes vivos. Ou, se você preferir, crus. Daí o nome crudívora. Os adeptos só se alimentam de vegetais crus. Mas não pense que isso significa simplesmente ralar uma cenourinha e colocar no prato. É algo muito além disso. Uma culinária que usa a técnica de desidratação dos alimentos e a germinação dos grão, que é o que dá força à comida e potencializa os nutrientes.

Inês resolveu juntar um grupo de pessoas para jantar e aproveitar que a chef canadense, Stéphanie Audet, estava no Brasil. Foi uma mostra de que essa culinária tem traços de alta gastronomia também. Stéphanie, roda pelo mundo ensinando a alimentação viva, quando não está viajando, fica no restaurante Crudessence (www.crudessence.com), em Montreal, no Canadá.

Éramos dez na mesa, alguns adeptos desta alimentação, outros nem tanto. O aperitivo foi o Kéfir de Goji e Pitanga. Kéfir é uma bebida fermentada, nesse caso ela usou a frutinha tibetana, a goji, que é rica em aminoácidos e a pitanga. Eu achei um pouco estranho, mas para os mais entendido foi um frison só.

O amuse-bouche era Cogumelos marinados, recheados com Patê de Nozes e Dill fresco coberto com Sour Cream de Pignoli e Alecrim. Tratava-se de cogumelos sem o caule, servidos “de cabeça para baixo” e por cima um creme de pinoles e alecrim. Denso e gostoso.


Seguimos com Sopa Thai de Côco, Coentro e Açafrão com Gengibre e Shitake. Muito delicada, de coentro, açafrão-da-terra, algas e cogumelos. Gostei muito. É para ser saboreada devagar, para apreciar lentamente o cheiro, os gostos e tudo mais. Obviamente, como gostei bastante, fui a primeira a acabar.


Existe toda uma preparação dos pratos, que tem que ser feito na hora de servir, por esse motivo há certa demora entre um parto e outro. Nesse momento percebi que comecei a ficar um pouco sonolenta e minha barriga se agitava. Como tínhamos tempo, começamos a conversar.

Quando chegou Lasanha de Abobrinha com pesto de Pistache fresco, fiquei encantada. Para mim, o prato mais bonito da noite. Muito saboroso também. Tudo nessa alimentação tem frescor.


A essa altura do jantar, todos a mesa, já se sentiam próximos e cada um de nós começou a fazer algum tipo de revelação. Um disse que é louco por salame, outra disse que por ser achar muito louca se tornou uma pessoa regrada. Tiveram aquelas que disseram que essa comida dá vontade de lamber o prato. Eu não disse nada, mas meu corpo disse. Comecei a me sentir com muita energia e minha barriga continuava agitada.

Para que todos ficassem quietos, chegou o Ravioli de Beterraba recheado com Ricota de Figo e Macadâmia, servido com Rúcula, Abacaxi e molho de mel de Figo e Balsâmico. A beterraba disfarçada de ravióli era cortada bem fininha e era crocante ao morder. Não gostei muito da salada. O abacaxi estava doce demais, achei que a combinação não funcionou bem.



Quando veio a sobremesa, (Torta Creme de Maple, Caqui, Castanha do Pará e Nibs de Cacao crocante com Yogurte de Côco fresco e Limão) levei um susto, era uma fatia enorme de torta de caqui com maple, para que não restasse dúvida a respeito da nacionalidade da chef é! E a crostinha era feita de cacau e noz do Brasil, para que ela não esquecesse onde estava. Estava tão boa que apesar de já estar satisfeita comi tudo.



Só depois do jantar é que me dei conta de que todos os pratos eram servidos em temperatura ambiente. Tudo me pareceu muito natural, talvez por isso, enquanto comia, não tenha nem notado. O sal, que a chef nos disse que usa com parcimônia, também nem se fez notar.

No final, Inês agradeceu muito a presença de todos e disse que estava realizando um sonho, que era reunir à mesa pessoas amigas e poder dividir com elas a comida que ela acredita como forma de vida. Na verdade quem tem que agradecer sou eu! Para mim foi uma experiência e tanto. A propósito, minha barriga parou de sacolejar. Acho que ela levou um susto com a tanta comida vida de uma vez só, uma mudança pra lá de súbita na minha alimentação normal.