quarta-feira, 28 de abril de 2010

Um almoço lendário

por Luciana Plaas


Pelé é o Rei do Futebol. Uma lenda viva. Paul Bocuse é uma espécie de Pelé da culinária. Está para a cozinha, assim como o nosso craque está para os gramados. São mitos, exemplos para o mundo. Por isso, ir ao restaurante de Paul Bocuse é uma experiência única. Seria, mal comparando, algo como jogar uma pelada com Pelé.

Outra coincidência real: em 1958, Paul Bocuse ganhou a primeira estrela Michelin. No mesmo ano, Pelé participou - e ganhou - a primeira das três Copas do Mundo que viria a conquistar. Três, aliás, é o número de estrelas Michelin que tem o francês desde 1965. Outro detalhe curioso: assim como Pelé gosta de comer bem, Bocuse é fanático por futebol!

Bocuse tem uma importância ímpar na gastronomia. Principal expoente da nouvelle cuisine, movimento da culinária francesa que buscou a valorização do ingrediente local, além de levar leveza e frescor à comida. Bocuse também assumiu o papel de embaixador da cozinha francesa e resgatou a dignidade do chef. Antes apenas mais um funcionário do restaurante, o chef ganhou um papel mais importante, tanto no marketing quanto, em muitos casos, na própria administração do lugar. Não é por acaso que muita gente se refere à gastronomia como antes e depois de Bocuse.

Após revolucionar a cozinha francesa, Bocuse percorreu o mundo. Conquistou o Japão. Abriu várias boulangeries-pâtisseries no pais do peixe cru. Até na Disney é possível ver o caminho percorrido por ele. Lá, junto com seus amigos Gaston Lenôtre e Roger Vergé, mantém três restaurantes, além de padarias no pavilhão francês da Disney World, em Orlando, na Flórida. Com tantas empreitadas mundo afora, mal pude acreditar na minha sorte em encontrá-lo em casa, ou seja, no restaurante dele em Lyon, em pleno domingo na hora do almoço.

Fui com Alexandre ao L'Auberge du Pont de Collonges. Ao chegarmos, pedimos duas tacinhas de champanhe como aperitivo. Junto, vieram duas bolinhas de massa choux, aquelas da qual são feitos os profiteroles. Só que com um pouco de queijo. Uma delicadeza.

Daí pra frente, tudo tomou um ritmo próprio. Parecia cronometrado. Comi Foie Gras com Molho Verjus. Este molho é muitas vezes feito com uvas verdes, justamente para dar um gosto ácido, como contraponto ao caramelado do foie. Um sonho. O foie gras derretia na boca. Difícil de descrever. Mas, espero, fácil de imaginar.

Meu primeiro prato foi Vieiras com Beurre Blanc e Batatas 'Soufflées'. O molho é feito com manteiga, como o nome já diz. Adiciona-se também uma redução ácida, normalmente vinagre, mas pode ser feita com vinho também. Com frutos do mar fica perfeito.

Quando pensei que já não poderia ter mais surpresa alguma, adentra o salão ele. O próprio! Com estilo e a maior paciência do mundo. Foi a todas as mesas. Todos quiseram fotos com o mestre. Não fomos diferentes. E nessa hora fica ainda mais evidente que além de todo o talento, Bocuse tem um carisma enorme.

Entre os pratos, para limpar o palato, um Sorbet de Beaujolais. Simples e bom. Cumpriu o papel com louvor

O almoço seguiu em grande estilo: Pombo com Massa Folheada e Couve de Bruxelas. Além da coxa do pombo, numa torradinha veio o patê feito com os miúdos da ave. Bem forte. Apenas provei. A massa folheada que vinha ao lado era bem alta, como deve ser. Leve e muito bem trabalhada.

Depois entramos em um mar de queijos. Só de olhar já cai bem. Tinha de todos os estilos, para todos os gostos. Fui de brie fresco, saint-marcelin e fromage blanc com creme. Estavam ótimos.

Na hora da sobremesa, fui tradicional: Crème Brûlée. Mas, na verdade, deu vontade de provar um monte de outras coisas. E até poderia, está incluso no menu. O problema é que não cabia mais nada!

Depois, com o café, vieram petit four, chocolates, e outras delícias. Ufa! Só mesmo uma boa caminhada na beira do rio Saône para ajudar a digestão e ir relembrando, aos poucos, tudo o que aconteceu. E o lugar é lindo. Não é à toa que por mais longe que Bocuse vá, é perto daquele rio que ele se sente em casa.




Um comentário:

  1. esse menu é impressionante. faz um resumo contemporâneo da 'revolução', imaginem, carrega quase um século de gastronomia.

    ResponderExcluir