terça-feira, 1 de novembro de 2011

O renascer do Kosovo



Na adega da Stone Castle os cheiros de vinho e madeira se misturam no ar. Cerca de cinco milhões de litros de pinots, merlots e chardonnays estagiam em diversas barricas e tanques. Orgulhoso, Shani Mullabazi, diretor geral da vinícola, balança uma taça do chardonnay 2010 e comenta. “É fresco. Tem uma excelente acidez, é vivo, e muito bom na boca”, diz. A Stone Castle fica em Rahovec, sudoeste do Kosovo. A indústria de vinhos do país literalmente quebrou nos anos 1990, com a guerra que veio a reboque do esfacelamento da Iugoslávia. Mas após anos de ajuntamentos dos cacos, há sinais de que a reconstrução vai se consolidando e o vinho do Kosovo vai, timidamente, ficando de pé novamente.

Rahovec – chamada de Orahovac pela minoria sérvia – é, há séculos, a maior área vitivinícola do Kosovo. Os vinhos de mesa feitos ali costumavam abastecer toda a Iugoslávia comunista. “Até os anos 1980, os vinhos daquela região tinham uma boa reputação, principalmente os feitos com a pinot noir”, diz a consultora Angela Muir, especialista em rótulos da região dos Balcãs.

Até o começo da guerra, as coisas iam bem para os produtores do Kosovo. Além de abastecerem as mesas iugoslavas, boa parte dos vinhos feitos ali era exportada para a Alemanha. Mas veio o pior e a indústria local foi desintegrada. Vinhas e adegas, em suma, toda a infraestrutura existente para a produção de vinhos foi abaixo, destruída.

Quando a guerra acabou, as vinícolas – então propriedades do estado – foram privatizadas. E começou o longo e árduo trabalho de reconstrução. Hoje em dia, finalmente, os ares estão mais leves e a indústria vinícola do Kosovo pode voltar a sorrir. E fazer planos.

Miro Brkic era economista. Virou produtor de vinhos. E defende com unhas e dentes a Rahovec em que vive. “Temos em média 270 dias de sol por ano. Esta é uma região perfeita para a produção de vinhos finos”, diz. “Se você for mais ao sul, para a Macedônia, as uvas têm muito açúcar. Ao norte, na Sérvia, a acidez é elevada demais”, compara.

Shani Mullabazi, da Stone Castle, diz que já opera em plena capacidade, produzindo 30 milhões de litros por ano. Agora, quer invadir a América. “No próximo verão, começaremos a vender nossos vinhos em Nova Iorque. Ali há uma grande comunidade de kosovares albaneses”, aposta.


Dono de uma pequena vinícola em Rahovec, Visar Hajrullaga foi buscar auxílio na Alemanha para aprender técnicas sofisticadas de enologia. E acredita que a vranac, uva autóctone dos Balcãs, pode ser um diferencial na conquista por um lugar ao sol – ou nas prateleiras das lojas e supermercados. “É uma uva que facilmente atinge os 14% de álcool, coisa rara nos tintos da nossa região”, ensina Hajrullaga.

Mas não foi apenas a guerra que minou as forças da indústria vinícola kosovar. O embargo promovido pela Sérvia aos produtos do país quando o Kosovo proclamou unilateralmente a independência de Belgrado atingiu em cheio os produtores, que ainda estavam em processo de reconstrução e vendiam seus rótulos majoritariamente no mercado sérvio. Recentes acordos foram costurados para que as vinícolas kosovares pudessem novamente vender aos sérvios.

Querelas políticas a parte, o sonho dos produtores do Kosovo é repetir o sucesso de eslovenos e croatas, também filhotes da ex-Iugoslávia e cujos vinhos ganham, ano a ano, reconhecimento internacional. E nesse dia, após anos de guerras e desavenças, possam brindar, em um palco do tamanho do mundo, e com vinhos kosovares, com certeza, por um presente melhor e um futuro de paz.

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